Para onde vai o Multilateralismo?

Donald Trump ganhou tudo o que havia para ganhar: a Presidência, o voto popular, o Senado, (provavelmente) a Câmara dos Representantes e já tinha do seu lado a maioria dos juízes do Supremo Tribunal. Teremos agora tempo para analisar as razões para estes resultados e para considerarmos as lições que possamos aprender. Mas há dois aspetos em que já sabemos o que Trump defende: o isolacionismo dos Estados Unidos, recusando o que possa ser um travão aos interesses e à capacidade de atuar, e sabemos também que o novo presidente tem uma visão transacional do mundo, onde o que interessa é quem ganha e quem perde e não se é possível encontrar uma solução em que ambas as partes cedam um pouco.

Estas duas características têm consequências, nomeadamente para um país como Portugal, que ancora a sua presença internacional nas organizações internacionais e na diplomacia. E mesmo sabendo que nem tudo o que se promete numa campanha acaba por acontecer, se considerarmos somente o que Donald Trump já disse sobre o Direito Internacional, a Defesa e o comércio teremos razões para nos preocuparmos.

Na Defesa, o presidente Trump há muitos anos que considera que a Europa vive à sombra do escudo protetor da NATO que depende das Forças Armadas, da tecnologia e do orçamento americano. E ninguém poderá acusar o antigo e futuro presidente de falta de clareza, pois este já disse muitas vezes que se os europeus não contribuírem para a NATO, os EUA não virão em seu socorro. Numa altura em que estamos a viver guerras às nossas portas e mais longe, os avisos de Trump não deveriam ser ignorados.

No comércio internacional, o presidente eleito anunciou uma política de protecionismo fiscal, taxando os produtos, bens e serviços que entrem no mercado americano, o que certamente levará a reações do resto do mundo e a uma guerra comercial, que poderá gerar uma crise económica, e ao colapso da já inoperante Organização Mundial do Comércio.

Finalmente, e com a ONU já muito fragilizado, a falta de apoio dos Estados Unidos aos princípios da Carta das Nações Unidas poderá colocar em cheque o Direito Internacional, que tem permitido, melhor ou pior, gerir as tensões entre a maior parte dos países do planeta.

Perante este cenário, ouvimos vozes que defendem que a resposta estará no reforço do papel da União Europeia, que deveria assumir um mesmo protagonismo na diplomacia e na Defesa que já tem na economia e no comércio. Mas essas vozes não parecem considerar que a UE está profundamente dividida entre Governos que receiam a visão Trumpiana do mundo e os que a abraçam, e para que a UE dê esse salto cósmico, será necessário encontrar soluções que contentem uns e outros.

O futuro, de facto, não se apresenta brilhante.

 

 

Bernardo Ivo Cruz, Professor convidado  IEP/UCP e NSL/UNL, membro do Conselho Diretivo do Clube de Lisboa

Artigo originalmente publicado no Diário de Notícias, em 11 de novembro de 2024.

Imagem:  Unsplash, Nils Huenerfuerst (Nações Unidas, Nova Iorque)