Desenvolvimento em tempos de incerteza

Leia as intervenções e o resumo dos debates da 3ª Conferência de Lisboa, com uma agenda rica sobre os grandes temas internacionais que afetam as nossas sociedades. Da geopolítica à segurança, da globalização à sustentabilidade do planeta, do desenvolvimento global aos desafios da União Europeia, foi assim o debate sobre o desenvolvimento em tempos de incerteza.

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Abertura Opening

“Muito do que encontramos hoje como travão ou obstáculo ao desenvolvimento tem a ver com a desatualização, a incapacidade de renovação e de resposta aos desafios atuais por parte dos sistemas políticos, económicos e sociais” – Marcelo Rebelo de Sousa

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Que desenvolvimento é possível neste tempo de incerteza?

O programa da conferência e os debates realizados salientaram a imprevisibilidade como um fator constitutivo das relações internacionais, num contexto mundial de grande instabilidade na atuação dos principais atores globais e de fortes tensões no cenário internacional, pondo em causa equilíbrios que tínhamos por adquiridos e, muito em particular, colocando em risco os mecanismos multilaterais e a própria democracia. Na sessão de abertura, isso mesmo foi salientado pelo Presidente da República, que alertou para a existência de uma "tempestade quase perfeita", provavelmente irreversível em várias áreas, que condiciona o desenvolvimento humano.

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Abertura

O Poder Power

“We are trapped by reality and all the fine position papers produced in Brussels and Washington are irrelevant to the fundamental problem, which is that we are in a moment when history is out of control and we are traveling in it” – George Friedman

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A Geopolítica na Caixa de Pandora

As perspetivas geopolíticas foram debatidas na sessão sobre O PODER, onde se analisou o contexto mundial particularmente após a crise financeira de 2008, em que a interdependência se tornou um facto inegável e o nacionalismo continua a ser um elemento constante. Com a China a sentir o peso da concorrência à produção, com a Arábia Saudita a sentir a crise do petróleo, e com uma nova administração americana focada no “America first”, a Europa continua a resistir a um governo centralizado e a viver os problemas do seu processo de integração, incluindo a gestão do Brexit. Como salientou George Friedman na sessão, estamos num mundo em que as belas análises e papers produzidos em Bruxelas e em Washington se tornam irrelevantes, com a narrativa a escapar-nos por entre os dedos face à aceleração das dinâmicas e à transformação da realidade. E se esta não é a posição mais confortável para estar, mais desconfortável ela se torna ao alimentarmos a ilusão que controlamos o rumo da história.

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O Poder

A Segurança Security

“A huge problem is the loss of legitimacy of states and the pervasive mistrust in political institutions, which is what upholds the rule of law” – Mary Kaldor

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Terrorismo e Disputas Estratégicas

A interligação entre violência extremista, interesses económicos e disputas geoestratégicas foi analisada no painel sobre A SEGURANÇA, numa sessão onde estiveram proeminentes as relações entre a Rússia e a União Europeia, marcadas pela recente tensão diplomática com o Reino Unido, em que as sanções à Rússia serviram essencialmente objetivos de política interna (tanto para o Reino Unido como para o regime de Putin). As respostas internacionais ao conflito sírio e a guerra ao terrorismo estiveram também no centro dos debates, com uma abordagem mais pessimista, quer pelo facto de o mundo ter estado à beira de um confronto militar entre EUA e Rússia, no caso sírio, quer pela descoordenação e visões diferentes no combate ao terrorismo, que passa mesmo pela divergência quanto à definição de terrorismo e de quem são os “inimigos”. A Síria e a Líbia foram referidos como expressão de um novo tipo de guerra, marcada por condições sociais anárquicas em que vários grupos manipulam a violência, espalhando ideologias baseadas no medo e tirando dividendos económicos. A dificuldade de gestão e resolução deste tipo de conflitos é evidente, na medida em que a abordagem militar e a clássica diplomacia não são suficientes, sendo necessárias abordagens assentes na criação de justiça e de legitimidade democrática, numa perspetiva de mais longo-prazo.

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A Segurança

A Globalização Globalization

“If the system begins to work in a way where most people feel that it doesn't deliver anything to them, you can expect a push back that will either damage democracy, lead to protectionism or both” – Montek Ahluwalia

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Será a Globalização Reversível?

É necessário analisar mais em profundidade a relação entre A GLOBALIZAÇÃO e a difusão do poder no mundo atual: difusão de poder dos Estados para grupos diversos, para o nível supranacional, entre outros fluxos. A coexistência de um mundo centrado nos Estados, ligado às fronteiras, à soberania, às instituições centralizadas, com um mundo ligado por fluxos, o mundo das redes, das conexões e dos dados, das economias digitais, com impactos negativos e positivos, traz-nos diferentes tipos de desafios, em termos da segurança e do desenvolvimento. A gestão atual das migrações são um exemplo da aplicação de abordagens tradicionais/territoriais de segurança a uma realidade que diz respeito a fluxos e redes.

Neste contexto, assistimos a um grande défice na governação global, com as instituições políticas não adaptadas à globalização, o que gera descontentamento e uma dissociação com as aspirações dos povos. A nova normalidade é não existirem certezas: os partidos políticos tradicionais fragmentam-se e a direita e a esquerda perdem-se em divisões internas, sendo a maior fratura atual entre aqueles que defendem a abertura e os que preferem o protecionismo e o nacionalismo. Outra questão é o impacto que a evolução tecnológica, a robótica e a inteligência artificial terão na recuperação da economia e na organização das sociedades. O sistema tem de funcionar de forma a que as pessoas não se sintam excluídas; no fundo, a pergunta de base para cada um é: “is globalization working for you?”

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Globalização

O Planeta Planet

“If we do not decarbonise our economy in the next 20 years we will not be able to keep catastrophic climate change away. I still believe we are making the change happen, but we might not be going fast enough” – Kitty van der Heijden

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A Instável Sustentabilidade do Planeta

Na sessão sobre O PLANETA ficou evidente a insustentabilidade do modelo atual e global de desenvolvimento, em que continuamos obcecados pelo crescimento económico contínuo e exponencial, apesar das evidências científicas sobre a urgência de alteração do paradigma. Se é verdade que a União Europeia tem feito um grande esforço de diminuição das emissões de gases com efeito de estufa, nos maiores países em desenvolvimento essas emissões estão a aumentar, como é o caso da China e da Índia. A previsão é que as economias emergentes continuem a crescer, mesmo que o crescimento abrande nos países industrializados e o seu papel é, portanto, fundamental nas respostas globais às alterações climáticas, nas opções sobre os modelos de crescimento económico e sobre a matriz energética.

Nestes países - mesmo estando a China e Índia entre os principais investidores nas energias renováveis e em fontes menos poluentes - a transição energética não se está a processar ao ritmo necessário para evitar consequências graves. É preciso mudar globalmente mentalidades modelos de negócio, hábitos de consumo, bem como mudar a forma de organização das cidades, onde vive uma parcela cada vez maior da humanidade. A esperança é que se consiga acelerar esta mudança por razões económicas, ou seja, pelo facto de as energias menos poluentes serem, cada vez mais, uma aposta economicamente inteligente, que gera lucro, emprego e desenvolvimento. Neste contexto, é fundamental a intervenção pública – e as políticas só mudam se alterações climáticas e a poluição forem um risco para a economia.

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O Planeta

As Pessoas People

"O modelo vigente não consegue continuar a sustentar a classe média. Neste sentido, a culpa não é da globalização, nem das tecnologias digitais, mas sim dos limites deste modelo de produção e consumo em massa"– Alfredo Valladão

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Classes Médias em Caminhos Divergentes

No painel sobre AS PESSOAS salientou-se a previsão de as classes médias serem formadas por mais de 3 mil milhões de pessoas em 2050, apesar de “a classe média dos pobres ser diferente da classe média dos ricos”. A classe média é que compra bens de consumo (duráveis ou não) e hoje há uma produção em massa para um consumo em massa, mas aquilo que ajudou a criar consumidores acabou por estragar o emprego. Só agora começamos a ver e a perceber alguns efeitos da revolução industrial tecnológica em curso, em sociedades fragmentadas e conectadas, nomeadamente sobre os padrões do trabalho e sobre o Estado social, questões amplamente debatidas nesta sessão. A forma como produzimos, consumimos e comunicamos está em rápida mutação, sendo necessário ter uma abordagem da realidade que vá para além do cálculo do PIB e da produtividade. No painel, foi também abordado o papel mundial da China, onde a expressão “crise” também significa “oportunidade”.

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As Pessoas

A Europa Europe

“We can imagine the European Union's life without the UK. Can we imagine life without either France, Germany, Italy, Spain or Portugal?  It is harder because historically people are dedicated to European integration” – Philippe Marlière

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Dilemas e Tendências da Integração

Os dilemas e tendências da integração na EUROPA foram o tema central deste painel, onde se analisaram várias facetas do populismo que cresce nos vários países europeus, desde o populismo do norte da Europa, muito ligado ao tema da imigração, ao populismo forte do leste europeu, ligado a um novo nacionalismo. Os oradores interrogaram-se sobre se Bruxelas está a fazer o que é necessário para manter o projeto europeu, concluindo que a União Europeia não é menos democrática do que os seus países membros e que o futuro europeu depende dos governos destes últimos. Os efeitos negativos do Brexit, a forma como os Estados Unidos vêm a Europa, a evolução histórica de uma Europa espremida entre a Rússia e os Estados Unidos, as relações franco-germânicas e o novo papel da política externa francesa no contexto europeu foram igualmente debatidos.

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A Europa

Encerramento Closing

“As grandes cidades afirmam os valores do interculturalismo, da tolerância, da abertura, da inovação. É onde se congregam os pontos de resistência face aos retrocessos da ordem internacional” – Fernando Medina

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Na sessão de encerramento das Conferências, foi expressada a preocupação pela época de incerteza global e de retrocesso dos valores de afirmação identitária da Europa. Não podemos ignorar o momento difícil que a Europa conhece e, nesse contexto, precisamos de ganhar tempo e de preservar o nosso ideal europeu numa base muito mais realista do que aquela que animou a política europeia da última década, onde erros sucessivos na gestão da nossa relação com o mundo agudizaram a crise em que estamos atualmente mergulhados.

O Presidente da Câmara Municipal de Lisboa afirmou a importância das grandes cidades europeias na luta contra o retrocesso dos valores e direitos, defendendo o papel das cidades como polos de defesa da diversidade e da inclusão. Este é o tempo de afirmação dos direitos fundamentais das pessoas, em que a reflexão tem de ser acompanhada da ação e em que a cidadania deve ser expressa ativamente.

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Encerramento

Biografias dos oradores                             Organizadores e Apoios