"Foi um trabalho duro, intenso não só por cada poço de petróleo mas com cada companhia [petrolífera] envolvida e com a própria Austrália", explicou Xanana Gusmão, revelando que o novo tratado das fronteiras marítimas entre Timor-Leste e a Austrália será ratificado a 30 de agosto. O anúncio foi feito pelo líder histórico timorense em Lisboa, à margem da conferência "Fragilidade dos Estados", organizado pelo g7+ e pelo Clube de Lisboa.
A data - "já acertada com o governo australiano", garantiu Xanana Gusmão - foi escolhida para coincidir com o dia em que se celebram os 20 anos do referendo em que o povo timorense se manifestou a favor da independência da Indonésia e representa o fecho de um ciclo de quase duas décadas de polémicas, protestos e intensas negociações que se prolonga desde a restauração da independência, a 20 de maio de 2002, período que acabou por marcar negativamente a relação entre os dois Estados.
Durante a conferência, em que também participaram Luís Amado e Jorge Moreira da Silva, Xanana Gusmão deixou críticas à comunidade internacional e à ajuda que dão a países em vias de desenvolvimento, como os que fazem parte da organização do g7+: "A comunidade internacional está a olhar para os países em vias de desenvolvimento, em construção, e quer que sigam os padrões internacionais, querem até que sejamos melhores do que países já com dezenas de anos de democracia. Não veem as características próprias de cada país".
Mas não foi a única crítica lançada pelo líder timorense que colocou em evidência um problema sentido pelos chamados países mais frágeis, em situação de pós-conflito, como os 20 países que fazem parte do g7+.
"Por causas desses apoios, ficamos com uma sensação de dependência o que não nos ajuda a crescer em termos de fazer planos estratégicos de desenvolvimento", afirmou o ex-Presidente timorense, após defender uma gestão dos recursos naturais "com transparência e firmeza".
E alertou: "É preciso resolver as causas dos problemas em vez de se olhar apenas para as consequências". Pegando no caso timorense, Xanana Gusmão salientou a importância da aprendizagem com a Noruega na criação do Fundo de Petróleo.
O ex-Presidente de Timor-Leste referiu outro momento determinante de aprendizagem para o país. "Temos a sorte de termos sofrido 25 anos para sermos independentes", afirmou Xanana Gusmão que depois explicou o porquê da "sorte": para além de apanharem a revolução digital já em marcha, foi tempo também de olhar para os erros entretanto cometidos por outros países em situação semelhante e evitar situações em que "países riquíssimos têm populações a viver na miséria".
Reconhecendo que ainda há um longo caminho a percorrer no desenvolvimento de Timor-Leste, Xanana Gusmão afirmou que esse é um processo para fazer sem pressas, com passos seguros e seguindo planos estratégicos. Para tal, defendeu, são necessárias instituições do Estado credíveis e a participação da sociedade - que "não deve ficar demasiado agarrada aos seus interesses, pessoais ou de grupos". Ou seja, defendeu, "os interesses nacionais devem ser postos acima de tudo".
Artigo publicado em Plataforma Media, 25.06.2019